quinta-feira, 11 de setembro de 2008

A Indefinibilidade da Filosofia

A Indefinibilidade da Filosofia
Normalmente no início do estudo duma disciplina que é novidade procede-se à sua definição e à determinação do seu objecto de estudo e respectivo método. Quando estudamos física, química, matemática ou qualquer outra ciência é fácil encontrarmos a sua definição pois há entre os vários físicos, químicos e matemáticos uma unanimidade na delimitação do seu objecto de estudo; mas não se passa o mesmo na filosofia.
Cada filósofo pode apresentar uma definição de filosofia que no fundo explica o seu modo particular de ver a realidade e que se relaciona com as respostas que esse filósofo dá às questões filosóficas. Cada filósofo define a filosofia a partir da sua própria concepção de filosofia Assim, não há uma definição satisfatória porque cada filósofo sublinha determinados aspectos, mas esquece sempre outros. O problema da definição da filosofia não deriva da inexistência de definições, mas da existência de tantas definições quanto filósofos.

Resumindo:
»» há uma quantidade incalculável de definições de filosofia
» nenhuma é totalmente errada ou certa
» cada filósofo define a filosofia a partir da sua própria concepção da realidade
» esta multiplicidade de definições tem a sua origem, em parte, na realidade infinitamente variada, que a filosofia procura apreender, isto é, no seu objecto.


Origem etimológica do termo filosofia

A palavra filosofia foi utilizada pela primeira vez por Pitágoras (filósofo e matemático grego do século VI a.C.) e deriva de duas raízes:
filo= amigo, o que gosta, o que ama, o que deseja,
e sofia= sabedoria.
Logo, o significado primordial de filosofia é amor à sabedoria e o filósofo é aquele que ama, que deseja, que gosta e que procura a sabedoria.
A filosofia é uma tendência natural do homem porque mais tarde ou mais cedo num qualquer momento da sua vida acabará por se interrogar sobre as grandes questões da vida e o seu significado. Ou seja, nascemos com uma curiosidade natural que nos leva a fazer estas perguntas.
Como diz Descartes:
“Primeiramente, desejaria explicar em que consiste a filosofia. Assim, começando pelos sentidos mais vulgares, esta palavra ´filosofia` significa o estudo da sabedoria e por sabedoria não se deve entender a prudência nos negócios, mas um perfeito conhecimento de todas as coisas a que ao homem é dado saber, tanto em relação à conduta da sua vida, como para a conservação da sua saúde e invenção das artes. (…)
Ora, viver sem filosofar equivale, verdadeiramente, a ter os olhos fechados, sem nunca procurar abri-los, e o prazer de ver todas as coisas que a nossa vista alcança não se compara à satisfação que confere o conhecimento do que se encontra pela filosofia; e, enfim, que este estudo é mais necessário para regrar os costumes, e conduzir-nos na vida, do que o uso dos olhos para nos guiar nos nossos passos”.


DESCARTES, R., Princípios da Filosofia, Lisboa, Guimarães Editores, 1995, pp. 26-28.

Assim, sem a filosofia a vida não teria tanto sentido nem daríamos importância às coisas que são efectivamente importantes. Por isso Descartes diz que viver sem filosofia é viver de olhos fechados.

Teste de Diagnóstico

“Sofia espreitou para a caixa de correio antes de abrir o portão do jardim. Geralmente havia muita publicidade e alguns envelopes grandes para a sua mãe. Sofia colocava sempre um monte de cartas na mesa da cozinha, indo depois para o quarto fazer os trabalhos de casa. (…)
Nesse dia havia apenas uma pequena carta na grande caixa do correio e era para Sofia.
«Sofia Amundsen» estava escrito no pequeno envelope. (….)
Imediatamente após ter fechado o portão, Sofia abriu o envelope. Encontrou uma pequena folha, que não era maior do que o respectivo envelope. Na folha estava escrito: quem és tu?
Mais nada. Não havia assinatura, apenas estas três palavras escritas à mão, seguidas de um grande ponto de interrogação.
Observou uma vez mais o envelope. Sim, a carta era de facto para si, mas quem é que a tinha posto na caixa do correio? (…) Foi sentar-se num banco da cozinha, com a misteriosa carta na mão.
Quem és tu?
Se ela soubesse! Era obviamente Sofia Amundsen, mas quem era Sofia Amundsen? Ainda não tinha descoberto totalmente.
E se tivesse outro nome? Anne Knutsen, por exemplo. Seria então uma outra pessoa?
Subitamente, lembrou-se de que o seu pai inicialmente lhe gostaria de ter dado o nome Synnøve. Sofia procurava imaginar como seria se cumprimentasse alguém e se apresentasse como Synnøve Amundsen – mas não, não conseguia. Imaginava sempre uma outra pessoa.
Saltou do banco e, com a estranha carta na mão, dirigiu-se para o quarto de banho. Colocou-se em frente do espelho, e olhou-se fixamente nos olhos.
- Eu sou Sofia Amundsen – disse.
A rapariga do espelho nem sequer respondeu com uma careta. Aquilo que Sofia fizesse, ela fá-lo-ia exactamente da mesma forma. Sofia procurava adiantar-se em relação ao espelho com um movimento muito rápido, mas a outra era igualmente rápida.
- Quem és tu? – perguntou Sofia.
De novo não recebeu nenhuma resposta, mas por um breve momento não soube se tinha sido ela ou o seu reflexo no espelho a fazer a pergunta.
Sofia tocou com o indicador no nariz reflectido no espelho e disse:
- Tu és eu.
Não recebendo resposta alguma, inverteu a frase:
- Eu sou tu. (…)
Por vezes achava-se tão estranha que se perguntava se não seria disforme de nascença. A sua mãe tinha-lhe falado num parto difícil. Mas seria possível o nascimento determinar, de facto a figura de cada um?
Não era estranho que ela não soubesse quem era? Não era absurdo não poder decidir nada quanto à sua figura? Tinha simplesmente nascido consigo. Podia escolher os seus amigos, mas não se escolhera a si mesma. Nunca tinha decidido que queria ser um ser humano.
O que era um ser humano?”

GAARDER, Jostein, O Mundo de Sofia – Uma aventura na filosofia, Lisboa, Editorial presença , 2001, pp. 9-11.



Responda sucintamente às questões:

1. Qual é a mensagem do texto ?
2. Faça um levantamento das questões que são levantadas por Sofia ao longo do texto.
3. Como reagiria se tivesse recebido uma carta como a de Sofia ?
4. Atribua um título ao texto.
5. Considera pertinente perguntar “O que é um ser humano?” tal como fez Sofia? Justifique.
6. Elabore uma pequena composição (entre 10 a 15 linhas), expondo o que pensa sobre as interrogações e possíveis respostas a essas interrogações.